Um novo marco para o registro de empresas: a Instrução Normativa n. 81 do DREI
Entrou em vigor no dia 1º de julho de 2020 a Instrução Normativa n. 811 do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI), visando a simplificação, modernização e desburocratização do processo de registro de empresas. Desde já, pode-se afirmar que essa instrução é um marco na regulação do registro empresarial, porquanto promoveu a consolidação e a uniformização de diversas normas esparsas, o que acarretou na revogação de 56 atos normativos.
O DREI é o órgão federal responsável pela regulação do Registro Público de empresas, ao qual todas as Juntas Comerciais estão subordinadas2. É a partir de suas normas que são estabelecidas as diretrizes técnicas para o registro e regularização das empresas no Brasil. A esse órgão competia a missão, determinada pelo artigo 5º, Decreto n. 10.139/2019, de revisar e consolidar os atos normativos referentes ao registro de empresas.
A Instrução Normativa n. 81 está inserida no contexto da Lei da Liberdade Econômica, editada para incentivar o desenvolvimento econômico do Brasil, tendo como premissas a liberdade como uma garantia no exercício das atividades econômicas, a boa-fé do particular perante o poder público, a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas e o reconhecimento da vulnerabilidade do particular perante o Estado3. De acordo com o Diretor do DREI, o Dr. André Santa Cruz, “quem trabalha, produz e gera emprego e renda no Brasil não pode ficar refém de papelada e correndo atrás de inúmeras normas para abrir ou alterar seu negócio”4.
Essa foi a racionalidade por trás dessa nova Instrução Normativa, que afeta a vida de todos os empresários. Além da consolidação, foi promovida uma série de alterações normativas, algumas delas merecedoras de destaque.
i. Dispensa de autorização prévia para registro5
A partir da Lei 13.874/2019, o registro de atos constitutivos, alterações e extinções deixou de depender de autorização governamental prévia. Consequentemente, a Instrução Normativa n. 81 fixou disposição sobre a matéria, deixando clara a desnecessidade de autorização prévia para o exercício das atividades reguladas, como por exemplo a relacionada a atividades financeiras reguladas pelo Banco Central do Brasil.
Assim, será realizado o registro da empresa, cuja atividade é regulada, e haverá a comunicação pela Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de empresas (Redesim) quanto a esse registro para que o órgão responsável realize a fiscalização.
ii. Indicação do objeto social no nome empresarial passou a ser facultativa6
A Instrução Normativa n. 81, em seus artigos 18 a 22, estabeleceu ser facultativa a indicação do objeto social no nome empresarial. Essa questão gerou inúmeras controvérsias, em razão da existência de disposições contraditórias no Código Civil7 na Lei 8.934/19948 e na Lei 6.404/19769 (Lei das Sociedade por ações), o que causava, também, muitos transtornos para a análise da viabilidade de nome empresarial nas Juntas Comerciais, atrasando o processo registral.
O DREI, então, adotou o critério da especialidade para consolidar o entendimento de que não é necessário haver a indicação do objeto social no nome, objetivando privilegiar a autonomia privada. Portanto, não será mais imposto aos empresários a obrigatoriedade de constar a atividade exercida no nome empresarial. Espera-se, a partir dessa disposição, que haja uma maior celeridade na análise do nome empresarial, com maior restrição às formalidades.
iii. Dispensa de instrumento de alteração para atualização de dados cadastrais10
Outra alteração importante visando a celeridade dos procedimentos do registro empresarial, foi a dispensa de realização de atas de reuniões ou alterações em contrato social para a atualização de atos meramente cadastrais, que será realizada como medida administrativa. Essa disposição aplica-se a informações pessoais do empresário individual titular de EIRELI, sócios, acionistas e associados de sociedades, além de informações relativas ao enquadramento, desenquadramento, reenquadramento como microempresa e empresa de pequeno porte e em enquadramento e desenquadramento como MEI.
iv. Ampliação do registro automático11
A Instrução Normativa estabeleceu que o arquivamento de ato constitutivo, alteração e extinção de empresário individual, EIRELI, sociedade limitada, com exceção de empresas públicas, e a constituição de cooperativa será deferido de forma automática quando os empresários optarem pela adoção do instrumento padrão, após a conclusão das consultas prévias de viabilidade de nome empresarial e de localização, quando for o caso.
Com essa disposição houve a ampliação do registro automático das empresas, que antes era restrito aos atos de constituição de sociedades limitadas, EIRELI e empresário individual. Permite-se, assim, maior agilidade nas alterações societárias.
Ainda para facilitar o procedimento, o sistema informatizado utilizado pela Junta Comercial deve impedir que os dados informados no Coletor Nacional sejam alterados quando do preenchimento dos dados complementares, a fim de evitar divergências.
v. Integralização de capital de EIRELI
A integralização do capital social de EIRELI foi otimizada pela Instrução Normativa n. 81, permitindo que valores acima do capital mínimo de 100 vezes o salário mínimo vigente possam ser integralizados posteriormente.
Na prática, portanto, ao constituir uma EIRELI, será necessário integralizar em dinheiro ou com bens pelo menos 100 vezes o salário mínimo vigente, e se o bem for avaliado em valor superior ao capital social mínimo e pretendido pelo titular, esse valor adicional poderá ser integralizado posteriormente, conforme necessidade para as atividades empresariais da EIRELI.
vi. Transformação de associações e cooperativas
Embora previsto em legislações dispersas e permitido pela Jurisprudência dos Tribunais brasileiros, a transformação de associações e cooperativas em sociedades empresárias não havia sido regulada pelo DREI até o advento da Instrução Normativa 81 em comento.
O ato para transformação passa a ser facilitado pelo simples registro no Cartório responsável pelas associações ou cooperativas e, uma vez aprovado nesse Cartório, seu arquivamento na Junta Comercial competente faz surgir todos os efeitos da constituição de uma sociedade empresária conforme o tipo adotado.
vii. Quotas preferenciais com direito de voto
Objetivando privilegiar a autonomia privada a partir de uma interpretação voltada para a liberdade contratual, admitiu-se na Instrução Normativa n. 81 o estabelecimento de quotas de classes distintas, nas proporções definidas no contrato social, observados os limites da Lei 6.404/1976. A quotas sem direito a voto não poderão ser consideradas para contagem de quórum de instalação e deliberação.
É mais uma opção dada ao empresário, que terá mais liberdade para fazer o arranjo societário que melhor se adeque a sua realidade.
viii. Convocação de reunião ou assembleia de sócios
A Instrução Normativa esclareceu que serão necessárias apenas três publicações, deixando expresso que não há a exigência de seis, desde que veiculadas em órgão oficial e em jornal de grande circulação, sendo necessária, pelo menos uma publicação em cada um deles.
Por fim, importante registrar que embora a entrada em vigor da Instrução Normativa tenha ocorrido no dia 1º de julho de 2020, as normas quanto ao arquivamento automático de atos de alteração e extinção de empresário individual, EIRELI e sociedade limitada, bem como de constituição de cooperativa (art. 43) entrará em vigor apenas 120 dias da data da publicação (13/10/2020)12.
Referências
1. http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa-n-81-de-10-de-junho-de-2020-261499054
2. A função do DREI está prevista nos artigos 3º e 4º da Lei 8.934.
3. Lei n. 13.874/2019, artigo 2º.
5. Artigo 9, §2º da Instrução Normativa n. 81.
6. Artigos 18 a 22 da Instrução Normativa n. 81.
7. CC, Art. 1.158. Pode a sociedade limitada adotar firma ou denominação, integradas pela palavra final “limitada” ou a sua abreviatura. § 1 o A firma será composta com o nome de um ou mais sócios, desde que pessoas físicas, de modo indicativo da relação social. § 2 o A denominação deve designar o objeto da sociedade, sendo permitido nela figurar o nome de um ou mais sócios.; CC, Art. 1.160. A sociedade anônima opera sob denominação designativa do objeto social, integrada pelas expressões “sociedade anônima” ou “companhia”, por extenso ou abreviadamente. Parágrafo único. Pode constar da denominação o nome do fundador, acionista, ou pessoa que haja concorrido para o bom êxito da formação da empresa.
8. Art. 35. Não podem ser arquivados: […] III – os atos constitutivos de empresas mercantis que, além das cláusulas exigidas em lei, não designarem o respectivo capital, bem como a declaração precisa de seu objeto, cuja indicação no nome empresarial é facultativa;
9. Lei 6.404/1976. Art. 3º A sociedade será designada por denominação acompanhada das expressões “companhia” ou “sociedade anônima”, expressas por extenso ou abreviadamente mas vedada a utilização da primeira ao final. § 1º O nome do fundador, acionista, ou pessoa que por qualquer outro modo tenha concorrido para o êxito da empresa, poderá figurar na denominação. § 2º Se a denominação for idêntica ou semelhante a de companhia já existente, assistirá à prejudicada o direito de requerer a modificação, por via administrativa (artigo 97) ou em juízo, e demandar as perdas e danos resultantes.
10. Art. 10 da Instrução Normativa n. 81.
11. Art. 43 da Instrução Normativa n. 81.
12. Art. 135, II da Instrução Normativa n. 81.